Mobilidade Interna 3.0: seu próximo talento pode estar a um ‘andar’ de distância

04 de junho de 2025

por Soraia Yoshida

Mobilidade Interna 3.0: seu próximo talento pode estar a um ‘andar’ de distância

Com a Inteligência Artificial (IA) carregando as transformações que estamos vendo no mundo do trabalho, é natural pensar que arquiteturas, estruturas, processos e até mesmo rituais estão passando por uma grande mudança. Some-se a isso a falta de profissionais capacitados para lidar com IA, Analytics e dados e temos um caminho praticamente inegociável em que o reskilling e upskilling têm um papel enorme dentro de todas as organizações. E, com eles, o redesenho da mobilidade interna na era da IA.

Até 2027, 44% das habilidades exigidas no trabalho mudarão, de acordo com o Fórum Econômico Mundial. Em vez de competir por talentos em um mercado saturado, muitas organizações estão aprendendo que olhar para dentro é mais rápido, mais barato e mais eficaz. A mobilidade interna emerge como solução operacional e, mais importante, uma imposição estratégica. Mais do que transferir pessoas entre funções, trata-se de redirecionar inteligência, desenvolver potenciais e garantir agilidade organizacional.

Mobilidade interna como prioridade estratégica

Segundo estudo do LinkedIn, 75% dos profissionais de Aquisição de Talentos dizem que a mobilidade interna será uma prioridade nos próximos cinco anos. O Institute of Corporate Productivity (i4cp) aponta que empresas de alta performance são duas vezes mais propensas a adotar programas estruturados de mobilidade interna do que aquelas de baixo desempenho. A mobilidade também está diretamente conectada à retenção, agilidade e capacidade de inovação.

“A mobilidade interna não é apenas sobre movimentar pessoas, é sobre reter inteligência, fortalecer cultura e acelerar resultados”, afirma o consultor de RH Gabriel Gatto. Para ele, em um momento de escassez de talentos, como este que estamos vivendo, “olhar para dentro não é uma opção, é um imperativo competitivo”.

Com mais de 15 anos de experiência, Gatto assiste a uma mudança praticamente sísmica em Recursos Humanos, que começou com a transformação digital, evoluiu para a automação e adoção de plataformas e agora se aproxima da integração de agentes de IA. Nesse cenário, ele ressalta que o gestor passa a ser um curador de talentos, conectando pessoas às oportunidades certas.

No entanto, apenas 10% das organizações possuem um inventário formal de habilidades de seus colaboradores, segundo estudo da i4cp. Isso limita a capacidade de resposta às mudanças e à adoção de novas tecnologias como IA Generativa.

Cultura, IA e mobilidade: uma nova sinergia

A cultura organizacional é o maior determinante para o sucesso da mobilidade interna. Se a cultura é de silos e controle, a mobilidade é vista como uma ameaça. Se é de aprendizado e crescimento, vira alavanca de valor. “O papel da cultura é crucial. Se não temos uma cultura e exemplo da liderança que fomentem a mobilidade interna, vamos falhar”, diz Isadora Gabriel, CHRO da Flash. Segundo ela, os comportamentos apoiados pela cultura que se traduzem nas práticas diárias da organização devem incorporar essa visão de valorização interna do talento.

“Contar as histórias das pessoas que fizeram movimentos que deram certo, dentro de um programa existente, e que continuam crescendo dentro da organização tornam o processo de cultura muito mais forte, muito mais sólido”, explica.

O consultor Gabriel Gatto concorda: “RHs devem promover histórias de sucesso e reforçar constantemente o valor da movimentação interna”.

É importante considerar que tanto millennials quanto jovens profissionais da Geração Z buscam motivação que vá além do simples “ter um emprego”. Isadora destaca a importância de treinar com base em problemas reais. Um case da Flash mostrou que profissionais de sucesso do cliente, ao serem treinados para vender, superaram equipes especializadas. A chave? Aplicar a nova habilidade imediatamente.

Como Estruturar Programas de Mobilidade

Mobilidade interna não é espontânea. Requer:

  • Mapeamento de habilidades e gaps
  • Plataformas internas de vagas e projetos
  • Trilhas de desenvolvimento personalizadas
  • Programas de mentoria cruzada
  • Reconhecimento formal de movimentações internas

Isadora Gabriel, CHRO da Flash, destaca que metodologias ágeis como o skill-based approach são essenciais para uma mobilidade mais fluida: “Pessoas deixam de ter cargos fixos e passam a ser alocadas em projetos de curta duração, com base em habilidades críticas”.

Métricas e Metodologias Ágeis

Mobilidade não é espontânea. Requer mapeamento de habilidades, plataformas de vagas, trilhas de desenvolvimento, mentoria cruzada e reconhecimento formal. Gatto cita Scrum, Design Thinking e OKRs como aliados para prototipar soluções com feedback constante.

Mimi Turner defende que a mobilidade deve ser planejada desde o início, como parte da estratégia de força de trabalho, e não só acionada na falta de candidatos. Os KPIs recomendados incluem:

  • % de vagas preenchidas internamente
  • Tempo médio de movimentação
  • Taxa de aceitação de ofertas internas
  • Tempo até produtividade
  • Retenção pós-mobilidade
  • Sentimento dos candidatos internos

Do Job ao Projeto: a desconstrução de funções

Uma tendência crescente é a “desconstrução de cargos”, substituindo o modelo tradicional por alocação baseada em habilidades para projetos temporários. Iniciativas como o U-Work da Unilever e Talent Cloud do governo canadense são exemplos.

Mas há desafios. Pesquisa publicada na HBR alerta para três tensões principais:

  • Autonomia vs. Controle: gestores ainda resistem a perder o controle dos talentos.
  • Desapego vs. Pertencimento: profissionais alocados em projetos se sentem outsiders.
  • Crescimento vs. Estabilidade: nem todos estão prontos para sair da “gaiola dourada” dos cargos fixos.

A solução passa por mudança de mentalidade (mindset), apoio emocional, redes de aprendizagem e contratos mais flexíveis. Mastercard e Spotify, por exemplo, incentivam a formação de guildas internas para conectar talentos por especialidade.


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