Entre o imã e a parede

19 de novembro de 2025

Entre o imã e a parede

Se as fábricas de Detroit pararem por falta de ímãs, o mundo inteiro sentirá o baque. Esses pequenos blocos metálicos, à base de terras raras como neodímio e disprósio, são o coração invisível da transição energética e da era digital. Sem eles, não há carros elétricos, turbinas eólicas, iPhones nem foguetes espaciais.

 

Mas quem controla essa engrenagem hoje é a China, responsável por mais de 90% da produção global de ímãs permanentes e cerca de 85% do refino de terras raras. Os Estados Unidos, que por décadas negligenciaram essa cadeia, tentam agora recuperar o terreno perdido. E o Brasil, dono de uma das maiores reservas do planeta, acaba de ser chamado a participar do jogo.

 

Nesta quarta-feira (15/10), durante audiência na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, confirmou que o Brasil foi convidado oficialmente pelos Estados Unidos para uma reunião sobre minerais críticos — tema central da Minerals Security Partnership, iniciativa americana que busca reduzir a dependência global de insumos chineses.

 

Silveira adiantou que o encontro será “altivo” e que o país não aceitará um modelo de neoestrativismo. Ou seja: nada de repetir o ciclo de exportar minério bruto e importar tecnologia. “O Brasil quer agregar valor às suas riquezas minerais”, afirmou o ministro, destacando que qualquer parceria com os Estados Unidos precisará respeitar os interesses nacionais.

 

Enquanto isso, os números contam outra história.

 

No 1º semestre, nossas exportações de terras raras cresceram dez vezes e somaram US$ 7,5 milhões. Cerca de 90% dos embarques tiveram como destino a China. A mina Serra Verde, em Minaçu (GO), tornou-se o primeiro projeto comercial fora da Ásia a explorar argilas iônicas — depósitos de baixo impacto ambiental e alto teor de terras raras —, e o principal destino de sua produção continua sendo o mercado chinês.

 

Washington observa de perto. Pequim antecipa movimentos. Brasília tenta equilibrar. O pano de fundo é uma disputa por autonomia tecnológica que vai muito além das jazidas.

 

Os EUA articulam uma nova rede global de fornecimento, o chamado friendshoring. A China, por sua vez, dobra a aposta na autossuficiência e no controle da cadeia. O Brasil surge como terceira via possível — um fornecedor de peso que ainda pode escolher se quer ser posto de extração ou polo de inovação.

 

Nos bastidores há avanços silenciosos. Em Lagoa Santa (MG), o CIT Senai ITR já domina parte do processo de fabricação dos superímãs de neodímio, ferro e boro — tecnologia atualmente concentrada na Ásia. O projeto MagBras – Da Mina ao Ímã, que reúne 38 instituições e conta com apoio do governo federal, pretende fechar o ciclo completo até 2030: da mineração à manufatura.

 

Mas, por enquanto, o Brasil ainda importa da China tanto os insumos quanto equipamentos usados na produção desses ímãs, o que expõe a dependência tecnológica que o país tenta superar. Se conseguir, poderá transformar reservas geológicas em poder industrial e diplomático.

 

Em Minas Gerais, o avanço da mineração em áreas sensíveis reacende o debate ambiental: nesta semana, o governo mineiro autorizou a exploração de terras raras no entorno de uma Área de Proteção Ambiental em Caldas, no Sul do estado — decisão vista por ambientalistas como um precedente arriscado. Há pressões ambientais e fundiárias, sobretudo na Amazônia e no Cerrado; e um dilema: seremos hub tecnológico verde ou fronteira extrativa?

 

A disputa por terras raras é, antes de tudo, uma disputa por tempo e posição. Os próximos três a cinco anos definirão quem lidera a economia da transição energética. O Brasil, geologicamente privilegiado e politicamente cortejado, enfrenta uma escolha: repetir o papel de fornecedor ou assumir o de protagonista. A corrida já começou — e o minério virou estratégia. No pó metálico das terras raras, o Brasil pode encontrar riqueza e influência.

 

A pergunta é: teremos projeto para isso?

 

O que está em jogo?

  • A disputa por terras raras é a nova corrida por poder industrial.
  • Executivos e investidores devem acompanhar como o país estrutura sua política de minerais críticos — ela definirá acesso a cadeias de energia limpa, semicondutores e defesa.
  • O posicionamento agora pode determinar quem lidera a transição energética da próxima década.
  • Investidores, executivos, formuladores de políticas e políticos do mundo agora estão de olho na conta @realDonaldTrump, da Truth Social . As postagens do presidente têm o poder de movimentar mercados e até mesmo abalar a ordem mundial. Agora, há outro hábito que estão cultivando: observar os anúncios do Ministério do Comércio da China. Um deles, inicialmente discreto, da semana passada, sobre novas regulamentações sobre as exportações chinesas de terras raras, causou ondas de choque no Ocidente.
  • Pequim se concedeu o poder de ditar o que muitas empresas, sediadas em qualquer lugar do mundo, fazem com produtos-chave que contêm terras raras ou materiais de bateria provenientes da China. De carros a painéis solares e mísseis. O temor é de um estrangulamento de US$ 1 trilhão, já que quase todas as empresas afetadas não têm para onde correr. Hoje. Amanhã, talvez...

 


A análise das oportunidades para o Brasil você encontra no artigo completo, no site da The Shift.


Conteúdo originalmente produzido e publicado por The Shift.
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